Os sentidos e a razão

Por Flavio Paiva

Que vivemos em uma sociedade que privilegia o prazer não é novidade. E até certo ponto não há nada de errado com isto. Quem não quer ter prazer, se ele é algo agradável? Porque não buscar o bom, o ótimo, se as experiências prazerosas nos deixam mais felizes e até mais plenos? Com mais energia, alegria.

Aparentemente, não há nada de errado nisso. Tenho amigos (não estou fora, só os estou referindo porque eles gostam mais do que eu) que sentem enorme prazer ao degustar uma boa cerveja ou vinho, espumante, enfim, alguma bebida alcoólica, mas especialmente cerveja. E, literalmente, sorvem cada gole como experiência intensamente prazerosa. E, efetivamente, é, com o adicional no caso da bebida de entregar um relaxamento, um bem-estar que dura algumas horas. Ora, que façam e curtam.

Outros (ou até os mesmos) são mais ligados no prazer de uma boa comida. Se dedicam ou a fazer com amigos deliciosos pratos e aproveitar ao máximo a experiência gustativa. (Aqui, uma ressalva: todas as pessoas gostam de uma boa comida, mas há os que têm nesta fonte um grau de elaboração e fruição infinitamente maior).

Existem ainda aqueles que têm um prazer gigantesco em fazer compras. Claro que não falo aqui de comprar uma casa, por exemplo. Estou falando da turma dos shoppings, em especial aqueles que compram roupas e acessórios. Estes sentem um prazer enorme ao adquirir uma nova calça, camisa, casaco, sapato, etc. Certo, que possam chegar em casa e colocar as sacolas sobre a cama e curtir. Ou, claro, pelos dias seguintes, ter a sensação que lhes dá prazer: estar usando algo novo, de uma tendência diferente, que as demais pessoas não possuem e por aí vai.

Bem, já entenderam a minha linha de raciocínio, óbvio. Não tem nada de errado em curtir as coisas boas da vida. Em especial se encontrarem no caso da cerveja (se encontrar no sentido de aquilo fazer e dar sentido, seja sozinhos ou acompanhados). Muito menos para quem aprecia uma boa comida. A elaboração, a reunião de amigos (ou cozinhar para si), o encontro novamente, a conversa descontraída e alegre.

Então, nada de errado, desde que este prazer não seja a única fonte de significado e existência destas pessoas. Senão, algo que traz sensações gostosas, em seguida traz o vazio. O antídoto a isto, como se sabe, é uma vida com propósito. E que estas sejam experiências verdadeiras, pois aí funcionará a razão, também, a que me referi no título da coluna.

Um teste para isso é ver se se consegue encontrar prazer em coisas simples, como tomar um sorvete com alguém (ou mesmo sozinho), admirar a natureza (seja em um grande cenário, seja em um pequeno jardim ao lado de uma igreja). Como eu digo, jamais deixar de se espantar (no sentido positivo da palavra) com as pequenas coisas da vida.

Se você tem isso, aproveite, e muito, todas as formas de prazer. Sabendo que algumas (ou quase todas) são fugazes, podem ser passageiras (estou falando de horas, dias ou semanas) e depois a vida retorna. Então, indispensável imprimir o fator experiência não apenas no sentido em que vem sendo empregado. Mas também experiência que atribua significado de vida. Então, sua vida estará muito mais próxima de um sentimento de completude e, se não completude, no rumo dela. Aproveite os prazeres, viva intensamente as experiências e guarde dentro de você os significados. Tendo tudo isto, você será forte e cada vez mais próximo do feliz.

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