Porto Alegre e o cenário do purgatório depois da tempestade

Por Márcia Martins

Escrevo a coluna na noite de quarta-feira (24), e pretendo encaminhá-la ao portal na mesma data, simplesmente por precaução. Não sei se na quinta-feira a luz iluminará minha humilde residência e, em consequência, se conseguirei usar meu notebook e terei sinal de internet. Sim. Embora não tenha sido tão afetada pelo temporal do último dia 16, como os mais de 1,1 milhão de clientes sem luz em todo o Rio Grande do Sul, que foi palco de chuvas torrenciais, rajadas de vento em velocidades preocupantes e queda de granizo, sofro desde então com uma instabilidade na energia elétrica.

Tanto que na semana passada ficou impossível redigir a coluna, já que fiquei toda a madrugada de quarta-feira sem luz, e quando voltou, no meio da manhã do mesmo dia, não havia sinal da operadora do fone fixo, da banda larga e da televisão. Aliás, pelos relatos que sigo lendo, outras operadoras demoraram bem mais para retomar os sinais. No meu apartamento, os serviços voltaram no final da manhã de quinta-feira. Mas a luz, que é responsabilidade da privada CEEE Equatorial, desde então, é uma incógnita. Nunca sei quando ela faltará. Já que os apagões costumam ocorrer umas quatro vezes ao dia.

Como sabia que Porto Alegre havia virado o cenário do purgatório depois da tempestade, visto que sou assídua das redes sociais (se a internet está funcionando), e quando tenho energia elétrica, acompanho os noticiários pela televisão, evitei me afastar de casa de quarta-feira até domingo. Apenas saídas essenciais. Ir na casa de uma amiga tomar banho e carregar o celular. Ao supermercado para um pequeno estoque de alimentos e farmácia para comprar remédios de uso contínuo.

Assim, no domingo quando finalmente criei coragem para caminhar um pouco pelo bairro, me assustei menos com a cidade devastada. Mas, confesso que a tristeza me abateu ao ver a quantidade de árvores tombadas ali na Praça Garibaldi, perto da minha casa, na Cidade Baixa. E a melancolia me invadiu com o relato de uma tutora de dois caninos que frequentam o cachorródromo do Tesourinha ao contar dos móveis estragados pela chuva que alagaram seu apartamento no bairro Menino Deus.

E falo de uma região que não foi tão atingida como outras tantas que ocuparam as manchetes dos jornais. Não fiquei quase seis dias sem fornecimento total de energia, não tive ruas bloqueadas nas redondezas pela queda de árvores e fios. E os serviços essenciais, principalmente a água, não chegaram a ser interrompidos.

A situação caótica em que se transformou a cidade e o Rio Grande do Sul poderia ter sido evitada. Não foi por falta de aviso. O alerta havia sido dado. Todas as previsões meteorológicas indicavam que o Estado seria, na terça, quarta e talvez quinta-feira (16,17 e 18 de janeiro), assolado por tempestades violentas. Não acho que os governantes tenham contato direto com São Pedro para evitar o temporal. Mas já é hora da elaboração de um planejamento de contingência a fim de enfrentar e minimizar os estragos causados por esses fenômenos climáticos.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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