Um atraso, um avanço

Por José Antonio Vieira da Cunha

Bah, me caíram os butiá do bolso com a decisão atrasada e preconceituosa do Conselho Federal de Medicina, que semana passada restringiu o uso da cannabis medicinal a apenas dois tipos de epilepsia. Com a autoridade de paciente que se trata com canabidiol com um resultado acima da expectativa, não há como estranhar esta nova posição dos doutos integrantes do CFM. Que foram além, proibindo inclusive os profissionais médicos de ministrar cursos e palestras sobre o uso de cannabis "fora do ambiente científico".

A presunção natural é que esta decisão tenha sido tomada a partir de inexistência de comprovações científicas a respeito dos efeitos do uso desta substância. Mas, convenhamos, vem na contramão do que se faz e se conhece em nível internacional, visto que o canabidiol tem se mostrado comprovadamente eficaz no combate a diferentes tipos de dor.

Agora mesmo, a Fundação Americana para Enxaqueca apresentou grandes novidades surgidas recentemente para o combate desta dor que alguns chegam a caracterizar como lancinante, verdadeiramente torturante. Pois o tratamento à base da cannabis está sendo apresentado como uma nova e extraordinária fonte de combate aos efeitos desta doença. Pesquisas realizadas entre 1987 e 2020 foram revistas e o novo olhar da ciência registra dados apontados como encorajadores, com redução de até 86% das dores em pacientes com enxaquecas.

Por isso, a decisão do CFM está sendo apontada como um preconceito vulgar em relação aos efeitos alucinóides da maconha, para dizer o mínimo. Isto é, que interesses estariam por trás de um posicionamento desta natureza, contrário aos fatos e ao que cientistas de países desenvolvidos estão atestando? Hein?

O saldo que fica é o de que, nesta questão, o obscurantismo corre solto.

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Competente, bem concebido e bem conduzido, o debate apresentado neste domingo por Band, Cultura, Folha e Uol pouco acrescentou ao cenário político atual, em que duas forças se digladiam, mas somou muito para o processo democrático brasileiro. Serviu, especialmente, como mais um atestado - já que a negação é tão grande que se torna necessário provar mais e mais a cada dia - de que o jornalismo profissional nos brinda diariamente com ações que merecem crédito e respeito. 

A seriedade imperou na organização e na apresentação da atração eleitoral, e o resultado foi o registro de números excelentes, já que o debate não se conteve ao alcance tradicional da televisão aberta mas extrapolou para o mundo digital. E aí a resposta foi excepcional, graças à participação do YouTube Brasil. Ao transmitir o debate, o canal considera a ação como 'live jornalística', e esta foi a de maior alcance em toda a história da plataforma, com 2.217.722 visualizações.

A Band ganhou muito também, quadruplicando sua média de audiência no horário e alcançando o segundo lugar na audiência medida pelo instituto Kantar Ibope Mídia - 11,8 pontos contra 14,5 da líder Globo que retardou em meia hora o seu Domingão na tentativa de evitar a sangria de telespectadores.

Com tal repercussão francamente positiva, é sim de se bater palmas mais uma vez para o trabalho de jornalistas profissionais.

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas passagens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem quatro netos. E-mail para contato: [email protected]

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