Eduardo Tessler: Tempos de convergência

Aos 42 anos, o jornalista acumula experiências em redações pelo mundo. Hoje, segue viajando, para prestar consultorias em projetos multimídia.

Descendente de imigrantes leste-europeus, Eduardo Russovski Tessler teve que enfrentar a família para seguir sua vocação, o Jornalismo. Desde muito cedo, ele sabia que não queria "seguir uma profissão normal", como as de seu pai, Abraão, médico, e de sua mãe, Lília (falecida há dois anos), agente de turismo. Ainda no colégio - ele estudou no Israelita - foi colega de Serginho Sirotsky, filho de Jaime, e ambos integraram o grêmio estudantil. "Começamos a fazer um jornalzinho bem legal, com papel-jornal, feito na Zero Hora. Isso me entusiasmou", lembra. Outra influência foi seu tio-avô, o crítico literário Maurício Rosemblatt. "É uma figura conhecida por aqui, o cara que inventou a Feira do Livro. Íamos na casa do velho Maurício e não víamos paredes nem corredores, só livros. Isso me levou um pouco para esse lado, tanto é que dediquei a minha monografia para ele e para o meu avô, que foram as pessoas que me ajudaram", conta.


As brigas se agravaram quando chegou a hora do vestibular. Eduardo prestou para Jornalismo na PUC e para Engenharia Química na Ufrgs. Passou nos dois, mas optou por se matricular apenas no curso de Comunicação Social, já que só prestara o outro exame por obrigação: "Era para o meu pai poder dizer aos amigos "meu filho passou em Engenharia"", admite. "Ele ficou completamente atrapalhado por eu não querer estudar na Ufrgs".


Para compensar, no ano seguinte, fez vestibular para História, na Federal, e cursou por dois anos, paralelo ao Jornalismo. "Fiz só as cadeiras que eu queria. Achava - e ainda acho - que a faculdade tem muita "matação", a gente não aprende nada. Na História, pude aprender algumas técnicas de pesquisa, coisas que eu achava importante saber", explica. Ainda assim, foi na faculdade que teve suas primeiras experiências como repórter e editor. Fez a edição do jornal Experiência por dois semestres e também começou uma carreira como cineasta, com um de seus filmes em Super-8 sendo indicado para o Festival de Gramado.


Buscando seu Kikito


Fora do mundo acadêmico, atuou como free-lancer da Ano Econômico, extinta publicação da RBS, onde descobriu que o grupo estava lançando um jornal em Santa Catarina. Se formou em 5 de janeiro de 1986, viajou para Florianópolis no dia 6 e no dia seguinte estava contratado no Diário Catarinense, na Economia. "O lançamento do jornal era sempre adiado e nesse meio-tempo teria o Festival de Gramado, com o meu curta "Lar Desfeito", concorrendo", recorda. Eduardo pediu folga para seu editor, Mário Xavier, que não permitiu. "Não sabia o que fazer, desesperado, desafiei o cara e vim. Ganhei o Kikito de Melhor Filme. Era diretor, roteirista e ainda fazia uma ponta como ator no filme. Quando eu voltei, ele não quis nem falar comigo, porque eu o desrespeitei e ainda por cima ganhei o prêmio", diverte-se.


No entanto, quando o Diário chegou às ruas, o repórter estava trabalhando ali, na editoria de Geral, graças à intervenção do amigo Emanuel Mattos. Durante a Copa do Mundo, foi transferido para o Esporte, onde ficou por um ano, como subeditor. Em agosto de 1987, após um desentendimento com o editor Armando Burd, deixou o Diário Catarinense.


Sem trabalho em Santa Catarina e sem querer voltar a Porto Alegre, Eduardo foi para São Paulo, onde conseguiu um frila nos fechamentos do Jornal da Tarde. Em seguida, foi convidado para editar a Placar: "Foi superlegal, eu era muito novo e comecei a fazer texto final para revista. Isso me deu uma baita cancha", comenta. Um mês depois, recebeu o convite da IstoÉ para ser subeditor de São Paulo. Com 23 anos, estava emocionado com a possibilidade de atuar numa das maiores revistas do país.


O sonho durou pouco. A publicação foi vendida para a Senhor e toda a equipe foi demitida. "Eu estava me achando o máximo e de repente não tinha mais nada", lamenta. A fase de desemprego acabou quando Tonico Duarte assumiu a editoria de Esporte no Estadão e o convidou para ser seu sub. Em meados de 1988, Eduardo determinou-se a sair do Brasil, a aventura era seu projeto de vida e, além do mais, sua então namorada vivia em Porto Alegre e não queria mudar-se para São Paulo e vice-versa. "A solução era morar fora", concluiu.


Pelo mundo afora


Candidatou-se a qualquer vaga para correspondente internacional da Agência Estado e surgiu uma oportunidade em Lisboa. Ele e a namorada embarcaram para Portugal, onde viveram por uns 10 meses. Com a Copa do Mundo de 1990 se aproximando, Eduardo recebeu uma proposta de O Globo para fazer cobertura de futebol na Itália, seria por um ano, mas o contrato acabou se estendendo por cinco. "Foi ótimo, fiquei lá, ganhando bem, viajando o mundo inteiro. Cobri Leste Europeu, Berlim, Oriente Médio?", relembra. Além do jornal, também fazia produção para a TV.


Em 1994, O Globo o chamou de volta a São Paulo para editar Internacional. Foi quando descobriu que a mulher estava grávida. Ela preferiu ter o filho, Gustavo, em Roma e, assim, o jornalista cumpriu seu contrato até o fim. Para continuar na Itália conseguiu um emprego na Editora Abril e escrevia matérias para Veja, Placar, Capricho, revista de fofocas, até retornar para o Brasil, no meados de 95, para assumir a editoria de Comportamento de Veja.


Broncas


Não chegou a entrar na revista, logo se desentendeu com o editor-executivo Mário Sabino. Eduardo participou então da criação de uma nova revista da Abril, a Viagem & Turismo, mas sua mulher não estava satisfeita em São Paulo e, ao saber que estava novamente grávida - de Victor -, decidiu voltar para Porto Alegre. O jornalista ficou mais três meses na capital paulista, até o lançamento da publicação, e então voltou também ao Rio Grande do Sul, para atuar como editor-executivo de Zero Hora, cargo que ocupou por quatro anos. "Tive muita bronca na Zero Hora, tenho uma visão de jornal completamente diferente da deles. Não concordei com algumas mudanças e era uma peça incômoda lá dentro", critica. Eduardo garante que só assina a Folha de S. Paulo, aos domingos, e só lê os jornais da Capital quando visita o pai, uma vez por semana. "Da Zero, só leio os classificados", afirma. Apesar dos atritos, ganhou inúmeros prêmios jornalísticos por suas matérias publicadas em Zero Hora , como os do Citibank, da Icatu e da Bovespa.


Em 1999, brigava não só com o jornal, mas com sua mulher, que logo se tornaria ex. Então, resolveu ir a São Paulo cursar o Master de Jornalismo, onde conheceu o professor Carlos Sorer, com quem teve grande afinidade. Sorer é o presidente da Innovation Consulting Group, empresa na qual Tessler trabalha atualmente. De volta à Capital, a RBS passava por um processo de transformação, havia contratado uma consultoria para traçar um projeto estratégico e ele foi designado para ser o representante das redações nesse estudo.


Um dos frutos desse projeto foi o surgimento do ClicRBS, do qual foi gerente de conteúdo até setembro de 2001, quando foi demitido. "Saí da empresa, mas saí bem, é coisa de empresa, mesmo, estamos sujeitos a isso", garante. Então, foi crescendo a aproximação com a Innovation, para a qual já havia realizado um trabalho como observador, em 99, na Venezuela, e um projeto, em 2000, no México. A partir dali, viajou para muitos lugares diferentes, como a República Dominicana, a Ucrânia e a Grécia, por exemplo.


Interatividade e convergência


"Hoje, sou especialista em interatividade e convergência, em ações realmente multimídia, o que não existe no Brasil. Existem empresas que têm muitas mídias e a Globo se aproxima do modelo como bi-mídia: o jornal com a internet. A RBS é empresa de muitas mídias segmentadas, mas não tem nenhuma ação convergente. Normalmente, o que se considera convergência no Brasil é só economia de dinheiro, quando uma pessoa só faz várias coisas, mas essa pessoa não está fazendo conteúdos complementares entre as mídias. As coberturas começam e terminam na mesma mídia, não há links nem complementaridade entre as elas", diz Eduardo, explicando a diferença entre ser multimídia e ter muitas mídias.


Ele tem se dedicado basicamente a essa área e viaja o mundo em função disso. Mesmo quando está em casa, está ligado à Innovation, graças à tecnologia da internet. Além dos trabalhos de consultoria, Eduardo segue fazendo reportagens como free-lancer, para não perder a veia jornalística. Recentemente, escreveu para a Brasileiros, revista de Ricardo Kotsho a ser lançada em breve. "Repórter, a gente nunca deixa de ser", alerta. O jornalista também tem feito muitas palestras sobre interatividade e convergência.


Viagens de todos os tipos


Embora adore viajar, acha que já está saturado de passar entre 15 e 20 dias fora da cidade e quer mais tempo para se dedicar aos filhos e à namorada, Fernanda. Quando está em Porto Alegre , é pai full time, pega as crianças e brinca, vai a parques, joga bola. Futebol é uma das suas atividades de lazer, mas tem evitado devido a uma hérnia de disco. Tem se dedicado a programas mais leves, como beber um bom vinho, uma cerveja, cozinhar, encontrar os amigos, ouvir música e ir ao cinema. Continua com pretensões como cineasta, tem até alguns roteiros prontos, mas nenhum foi rodado - "ainda", adverte.


Viagens a lazer nunca são demais, pois é uma oportunidade de passar tempo com os filhos, já foram a Disney e a Bariloche e a próxima será ao litoral catarinense, onde devem passar o Ano Novo. Ele reconhece que deveria escrever um livro, já que não há muita bibliografia sobre convergência, mas ainda não encontrou tempo. O grande projeto para o futuro é morar com Fernanda, que também tem um filho. Por isso consulta os classificados, está em busca de uma casa que acomode todos.

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