Conteúdo autêntico em tempos de IA: transparência é o novo valor das marcas
Autenticidade virou ativo estratégico que exige práticas éticas de Comunicação
No rastro da expansão das Inteligências Artificiais (IAs), produzir conteúdo autêntico se tornou um dos maiores desafios das equipes de Marketing. Nesse cenário, a diferenciação entre marcas deixou de depender apenas de criatividade e passou a ser uma questão de credibilidade. "Ser autêntico nunca foi tão importante e tão essencial à sobrevivência de uma marca", avaliou Sebastião Ribeiro, sócio-fundador das agências Cartola e Amanita.
Para o jornalista, a IA gerou uma "pasteurização" dos conteúdos que, embora ganhem em qualidade, parecem sempre muito semelhantes entre si. Essa homogeneização das mensagens leva o público a valorizar o que soa humano e transparente. "A Creator Economy ganhou ainda mais espaço com a Inteligência Artificial, porque aumenta a demanda por aquilo que é único", completou. Para as empresas, isso implica ir além da coerência visual: é necessário cultivar uma personalidade de marca que se manifeste em todos os canais.
Ter autenticidade de conteúdo, segundo Sebastião, é alinhar a Comunicação externa à identidade estratégica. "Não adianta a marca buscar ser autêntica nas redes sociais se isso não faz parte da personalidade dela, se não está na estratégia ou no branding", destacou. Essa coerência torna-se ainda mais crítica em um cenário em que a atenção é limitada e o volume de conteúdo é infinito. "Nunca se produziu tanto conteúdo, só que a nossa capacidade de consumir ele não muda", reforçou.
Autenticidade mensurável
Mas como medir algo tão subjetivo quanto a autenticidade? Para Luciana Mutti de Morais, psicóloga e diretora de Pesquisa na Vitamina, é possível - desde que a própria marca defina o que significa ser autêntica dentro do seu contexto: "Não existe uma métrica genérica". Para encontrar esses medidores, os times de Marketing precisam primeiro entender quais atributos os consumidores enxergam como autênticos em relação à empresa.
Esta primeira etapa é qualitativa e pode ser feita por meio de entrevistas em profundidade, grupos focais ou visitas a pontos de venda. "Aqui nós levantamos quais são esses atributos de marca que indicam autenticidade. E então, em um segundo momento, passamos a mensurar a evolução da percepção desses atributos de marca", detalhou. Esse monitoramento pode ser feito de forma quantitativa por meio de índices ou notas que acompanhem a evolução da percepção: "A cada rodada, você observa se a marca está estável, se aproximando ou se distanciando daquilo que o consumidor considera autêntico".
Da lei à ética: como os dados influenciam o conteúdo autêntico das marcas
A forma como uma empresa comunica suas políticas de dados também impacta a autenticidade de seu conteúdo e a percepção de confiança. Sebastião cita a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) como um avanço, mas o consumidor segue sendo "a parte mais frágil dela". "Todos os sistemas são feitos para que a gente sempre permita o uso dos dados", criticou. Para que exista um consentimento real em relação ao uso de dados, o usuário precisa estar consciente do que ele está cedendo e isso só acontece quando a política de privacidade possui uma linguagem acessível.
É por isso que simplificar políticas e comunicações é parte do esforço por um Marketing de conteúdo autêntico e ético. Sebastião defende uma mudança semelhante à ocorrida na indústria farmacêutica. "Existiam aquelas bulas gigantes e incompreensíveis, mas a regulamentação do mercado exigiu uma suavização", destaca. Contudo, as marcas podem tomar a dianteira. "Não tem nada que impeça uma empresa de resumir sua política de privacidade e explicar como usará os dados em uma mensagem mais objetiva e clara. E eu acho que o consumidor valorizaria isso", pontuou.
Além disso, garantir autenticidade no Marketing Digital exige verificar se as ferramentas de coleta e personalização realmente operam de forma ética. Há sistemas capazes de cruzar fontes de informação - como dados consentidos, enriquecimento de perfis e rastreamento comportamental - para identificar a atividade de navegação e associá-la a informações pessoais sensíveis. "Em alguns mercados que respeitam menos a LGPD, como o imobiliário, é comum você estar navegando mesmo sem estar logado, olhar um anúncio e o corretor te chamar. É uma abordagem que não é só inconveniente, como ilegal", afirmou.
Desafio da IA para a confiança do consumidor
Com a popularização dos modelos de linguagem de Inteligência Artificial - como ChatGPT e Gemini -, Sebastião prevê que uma nova fase na discussão sobre privacidade deve surgir conforme essas plataformas começem a inserir anúncios. Enquanto nas redes sociais o usuário expõe preferências e hábitos de navegação, nas interações com assistentes virtuais há troca de informações íntimas, pessoais e emocionais. "Tem gente fazendo terapia com ChatGPT. Estamos dividindo com a IA o que temos de mais íntimo", alertou.
Para o jornalista, isso levará a discussão sobre privacidade para outro patamar, com maior mobilização da sociedade para a imposição de limites legais e pela regulamentação. "Agora, independentemente do que é ou será legal, se as marcas passam do ponto e o consumidor se sente exposto a reputação ficará abalada de certa maneira", destacou.
Por mais que estejam dentro da lei, sempre que uma comunicação ou um contato for considerado invasivo, haverá um impacto negativo. Ou seja, o ponto de equilíbrio entre personalização e invasão está mais no campo da percepção do consumidor do que na letra da lei. Além disso, com o avanço das tecnologias de segmentação e automação, o risco de ultrapassar essa fronteira cresce. "Muitas vezes a ansiedade dos operadores de Marketing e comerciais por usar dados na maior granularidade possível faz com que as marcas se tornem invasivas", finalizou.
Alavancar essas tecnologias é fundamental para otimizar operações e potencializar o crescimento de negócios a longo prazo. Por isso, a partir de agora, o cenário de tecnologia para Marketing passa a contar com um espaço dedicado neste portal. Acompanhe na editoria ColetivaTech.
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