A ambientação do trabalho remoto à vida social

Por Elis Radmann

Saímos diferentes da pandemia. Como tudo na vida, com algumas experiências positivas e outras negativas. Além de atentar contra a saúde da população, a pandemia também atacou o mundo do trabalho e, por sua vez, a economia mundial a partir das medidas restritivas e da imposição do isolamento social.

Se dermos um "zoom" no mercado de trabalho vamos perceber que a pandemia alterou a forma social de produção do trabalho e o processo de comunicação do mesmo. 

Pesquisa realizada pelo IPO - Instituto Pesquisas de Opinião identificou que 2 de cada 10 gaúchos conseguiram trabalhar de forma remota durante a pandemia, mantendo a comunicação virtual com chefes e colegas de trabalho e aprendendo que as reuniões poderiam ser realizadas de forma remota. A maioria relatou mais experiências positivas do que negativas com o trabalho home-office: "foi uma forma de continuar trabalhando". 

Entretanto, a grande maioria reconhece que o trabalho remoto se mistura à vida familiar. As mulheres relatam um sentimento de culpa por trabalhar em casa e não dar a atenção necessária à casa e à família, especialmente aos filhos. Mesmo assim, são mais adeptas ao trabalho remoto do que os homens. Os homens citam que o trabalho remoto diminui a concentração, a troca de experiências e a relação com colegas. 

A narrativa de homens e mulheres que trabalham remotamente traz à tona a nossa parca cultura de entendimento e respeito ao trabalho realizado no ambiente familiar. De um lado, quem está trabalhando dentro de casa se sente mais responsável em dar conta do almoço, da manutenção da casa, em atender a porta e/ou dar atenção para as crianças. Por outro lado, há familiares e vizinhos que ainda não têm a compressão necessária de que o ambiente doméstico também pode ser um local de trabalho, que exige concentração e sossego. Sem contar que a maior parte dos espaços privativos dos domicílios brasileiros não foram planejados para abrigar o trabalho remoto. Estou falando de muitas casas ou apartamentos sem um espaço adequado para a realização de atividade laboral.

Todos os entrevistados convergem para um grande ponto positivo, a diminuição do tempo gasto no deslocamento, em especial, nas grandes cidades. O trabalho em casa se torna algo mais prático, inclusive no visual, diminuindo os gastos com as roupas. Como sempre, há prós e contras. Se economiza de um lado e se gasta de outro. O trabalho remoto também é lembrado por aumentar os custos com energia elétrica e internet.

Recente estudo nacional do DataFolha sinalizou que, se o brasileiro pudesse escolher uma forma de trabalho, 24% ficariam com trabalho remoto, 28% optariam pelo trabalho híbrido e 45% afirmam que escolheriam trabalhar presencialmente.

A opção de escolha pela forma de trabalho está associada à natureza do mesmo. Segundo o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), só um de cada quatro trabalhadores brasileiros têm condições de trabalhar remotamente, levando em consideração a natureza da atividade. A pesquisa do IPO identifica média similar no RS, quase 60% dos gaúchos não têm um trabalho compatível com a atividade remota.

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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