Coopítulo 58 - O Rio Grande (II)

Por José Antonio Vieira da Cunha

O semanário O Rio Grande não durou muito, apenas seis meses, 27 edições. A estrutura de pessoal era insuficiente e o jornal acabou se enredando em uma receita difícil de ser digerida por leitores, ao privilegiar dedicar espaços a matérias de fundo social ou de denúncia, especialmente na área policial. Mas, verdade seja registrada, não faltaram boas matérias, muito boas reportagens. A condenação de Flávio Alcaraz Gomes, por exemplo. Só um jornal com as características de O Rio Grande poderia dar ao assunto o destaque que merecia, ofuscado pela grande imprensa para não constranger muito o personagem, estrela do radiojornalismo na época. Na edição 17, de 30 de agosto de 1979, a manchete em letras garrafais gritava: "CONDENADO - a violência do crime cometido há 40 meses pesou sobre os jurados, que condenaram Flávio Alcaraz a 12 anos de prisão".

Assim, foi difícil aceitar a rejeição pelo leitor. O editor Osmar Trindade lamentaria depois que a deficiência de pessoal foi o maior entrave ao originar problemas de produção editorial e, por extensão, problemas de fechamento durante a maioria das 27 edições, ocasionando atrasos que se acumulavam, com reflexos no setor industrial e, inclusive, no acabamento do jornal. Ele era vice-presidente da Cooperativa dos Jornalistas neste período (iria ser eleito presidente no ano seguinte) e fez esta leitura final:

- Apesar de tudo, o jornal progressivamente estava formando o seu leitor. Nas áreas onde ele atuava com maior desenvoltura, porque tinha pessoal eficiente trabalhando sempre, como polícia, justiça, direitos humanos, questões sindicais e sociais em geral, sentia-se a presença do jornal. Se você vende quatro mil ou cinco mil exemplares de um jornal, em torno do qual nunca se fez praticamente nada para promovê-lo, e se o número de leitores aumenta progressivamente, é evidente que uma boa parte da chamada receita do jornal está pronta.

O sucesso esperado não aconteceu, talvez porque o que o semanário oferecia não era o que o público queria ler. Os estudos iniciais do projeto indicavam que o resultado seria positivo se o semanário vendesse o equivalente a duas páginas de publicidade e cinco mil exemplares por edição. A média em sua efêmera existência foi de meia página publicitária e cerca de 2 mil exemplares vendidos em banca, o que apresentava uma receita insuficiente para cobrir os custos, mesmo que estes fossem mínimos.

Rosvita Saueressig, que chefiava a reportagem e a Central de Produção, diria alguns anos depois que o fim de O Rio Grande pode ser atribuído em parte à falta de capital de giro que permitisse ao semanário sustentar-se mais um pouco, "enquanto se processavam as mudanças internas indispensáveis para que ele se firmasse junto ao público leitor".

Manoel Canabarro, que cerca de um ano depois seria um dos editores do Coojornal, reflete que "a experiência com o semanário ensinou que não se poderia buscar na publicidade a fonte de receita para um jornal que se pretende crítico e independente". A dura realidade era que o jornal praticamente não tinha anúncios, parte disso atribuída ao fato de que a imagem do irmão mais velho, o Coojornal, estava desgastada junto ao mercado publicitário em função da perseguição política de que era alvo. 

O Rio Grande fechou em novembro quando apresentava uma tiragem média de quatro mil exemplares, incluindo assinantes, venda em bancas e reparte para cortesias, gerando uma receita insuficiente que deixou como saldo um rombo financeiro na cooperativa. A tiragem era considerada boa para um semanário, mas neste momento pode-se dizer que o medo falou mais alto, o medo de que o prejuízo do jornal fosse implicar em levar a cooperativa de roldão. Há quem considere um erro o jornal ter sido lançado, há quem considere um erro seu fechamento ter ocorrido tão precocemente, mas o resultado final é que provocou um abalo nos alicerces movidos a esperança pelos associados.

Esta esperança fora alimentada por uma das promessas feitas pela chapa de situação na eleição do ano anterior e, apesar dos problemas financeiros que a cooperativa já enfrentava, a promessa seria cumprida. O gerente Eládio Dios insistia na tecla de que era prematuro iniciar a nova empreitada naquele momento, em que a cooperativa apresentava uma estrutura financeira frágil sem capital de giro. "Nosso caixa era sempre zerado mesmo tendo pago todas as contas no final daquele ano", relembraria o executivo, ressalvando que "não possuir dívidas pode ter entusiasmado o pessoal a enfrentar o desafio".

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Já referi em outras oportunidades que um dos maiores simpatizantes e estimuladores da Coojornal era o presidente da Cotrijuí, Ruben Ilgenfritz da Silva, que viria a se tornar um grande amigo. Ruben era inquieto e hiperativo graças a uma inteligência acima do comum. E senhor de uma franqueza invulgar: não foram poucas as vezes em que, durante alguma conversa, exclamava algo tipo "tchê, vocês estão totalmente errados" - e dava sua sugestão, geralmente exata para a situação. Não por acaso, a Cotrijuí figurou sempre entre os principais e frequentes anunciantes do jornal. Foi muito triste receber a notícia de sua morte no último dia 8.

Autor
José Antonio Vieira da Cunha atuou e dirigiu os principais veículos de Comunicação do Estado, da extinta Folha da Manhã à Coletiva Comunicação e à agência Moove. Entre eles estão a RBS TV, o Coojornal e sua Cooperativa dos Jornalistas de Porto Alegre, da qual foi um dos fundadores e seu primeiro presidente, o Jornal do Povo, de Cachoeira do Sul, a Revista Amanhã e o Correio do Povo, onde foi editor e secretário de Redação. Ainda tem duas passagens importantes na área pública: foi secretário de Comunicação do governo do Estado (1987 a 1989) e presidente da TVE (1995 a 1999). Casado há 50 anos com Eliete Vieira da Cunha, é pai de Rodrigo e Bruno e tem quatro netos. E-mail para contato: [email protected]

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