Leis para poucos, descrença de muitos

Por Elis Radmann


Toda vez que os pesquisadores do IPO - Instituto Pesquisas de Opinião realizam escutas da população através de pesquisas quantitativas e qualitativas, uma percepção se repete: a maioria da população desaprova qualquer proposta de deputados ou senadores que vise ampliar regalias ou vantagens para os próprios parlamentares ou para servidores públicos, incluindo o judiciário.

Projetos como o aumento do número de deputados na Câmara, a blindagem contra afastamentos cautelares mesmo em casos de investigação criminal, ou a exigência de aviso prévio sobre ações judiciais envolvendo parlamentares são vistos pelo povo como totalmente oportunistas e referendam a ideia de que os "políticos atuam em causa própria". Tecnicamente, são chamadas de leis casuísticas, criadas por conveniência política ou ideológica.

Para o cidadão comum, o Congresso Nacional dedica mais tempo a disputas ideológicas, negociações internas e à criação de leis que beneficiam seus próprios membros do que à formulação de políticas públicas que melhorem a vida da população. Essa lógica não é nova: remonta à velha política, desde os primeiros anos da República. Mesmo com o eleitorado rejeitando práticas personalistas e clientelistas, os representantes ignoram as dores reais da sociedade. Como resposta, cresce o descrédito popular em relação ao Congresso.

Essa constatação, no entanto, acaba tendo pouco impacto sobre os parlamentares. Eles sabem que o povo brasileiro, em geral, é pacífico, pouco engajado politicamente e tende a votar guiado pela imagem dos candidatos, construída por estratégias de marketing eleitoral. 

Uma reportagem recente da Folha de São Paulo ilustra bem o poder concentrado nas mãos dos congressistas: um único senador administra recursos superiores aos orçamentos de 44% dos municípios brasileiros. Já um deputado federal pode direcionar emendas parlamentares que superam os recursos de 14% dos municípios.

Diante desse cenário, o eleitor é levado a acreditar que ter um deputado federal e especialmente um senador, atuando em sua região, é sinônimo de mais recursos para saúde, educação, infraestrutura e outras áreas essenciais. Em algumas cidades, deputados investem mais em pavimentação de ruas do que a própria prefeitura. 

É natural, portanto, que os eleitores que recebem os recursos fiquem satisfeitos com esse modelo de representação focada em nichos, deixando que a maioria dos eleitores fique à mercê, mantendo a esperança de que "dias melhores virão". Não é por acaso que cresce o número de candidatos a deputado apoiados por prefeitos locais, como forma de garantir benefícios futuros para o município.

De um lado, é possível afirmar que o sistema político vigente funciona "corretamente" dentro das regras e negociações que os próprios parlamentares criaram e mantêm. Mas, se olharmos para o ideal da democracia representativa em um Estado republicano, é evidente que falta equidade, transparência e compromisso com o interesse coletivo. A política, nesse modelo, deixa de ser instrumento de transformação social e se fortalece como ferramenta de manutenção de privilégios.

Esse tipo de reflexão sempre nos leva à mesma pergunta: são os eleitores que promovem os políticos, ou são os políticos que subjugam os eleitores?

Autor
Elis Radmann é cientista social e política. Fundou o IPO - Instituto Pesquisas de Opinião em 1996 e tem a ciência como vocação e formação. Socióloga (MTB 721), obteve o Bacharel em Ciências Sociais na Universidade Federal de Pelotas (UFPel) e tem especialização em Ciência Política pela mesma instituição. Mestre em Ciência Política pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Elis é conselheira da Associação Brasileira de Pesquisadores de Mercado, Opinião e Mídia (ASBPM) e Conselheira de Desburocratização e Empreendedorismo no Governo do Rio Grande do Sul. Coordenou a execução da pesquisa EPICOVID-19 no Estado. Tem coluna publicada semanalmente em vários portais de notícias e jornais do RS. E-mail para contato: [email protected]

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