Nada de mais importante para a cidade de Porto Alegre

Por Márcia Martins

Porto Alegre é um exemplo de cidade bem administrada. As ruas e praças estão bem iluminadas. E algumas praças, segundo o prefeito, até revitalizadas. Os lixos são recolhidos regularmente e a coleta é pontual. O transporte público é de excelente qualidade e a tabela de horários é cumprida rigorosamente. A guarda municipal é acionada somente para situações em que sua ação é necessária. A educação infantil oferece vagas para todos os alunos. E, em consequência, as mães podem trabalhar com tranquilidade. E a população sabe com exatidão para qual investimento vai o dinheiro pago com os impostos municipais.

Neste cenário de cidade ideal descrito acima (e é claro que contém ironia porque a capital gaúcha sente falta de todos os itens que atestariam melhor qualidade de vida e um lugar bom de se viver), nada mais natural do que os vereadores se preocuparem com questões menos importantes. Como a roupa que os vereadores, vereadoras, assessores, assessoras, servidores e servidores do Legislativo Municipal usam dentro do plenário da Câmara Municipal.

Mesmo que não tivessem nada de mais importante para se preocupar, será que regras de vestimentas para acessar o plenário deveriam entrar na pauta de debates e votação da Câmara e exigir a atenção dos nobres parlamentares. Tenho uma certeza quase absoluta que não.

Pois, numa iniciativa da presidenta da Câmara, Nádia Gerhard (PL), deverá ser votada no dia 12 uma resolução que proíbe uma série de vestimentas dentro do plenário. Tal absurdo entrou em votação na segunda-feira (3), mas não seguiu adiante uma vez que o vereador Alexandre Bublitz (PT), terceiro secretário da Câmara, pediu vistas.

Se aprovada tal anomalia, estarão vetados o uso de chinelos ou sandálias rasteirinhas sem alça traseira, calçados visivelmente danificados, sujos ou incompatíveis com a formalidade do ambiente, bermudas, shorts, calças curtas, de moletom ou pijama, peças excessivamente justas, rasgadas, transparentes ou com aspecto de lazer (o que seria isso?), minissaias, saias ou vestidos cujo comprimento esteja acima dos joelhos. E dizer que estamos quase no final do ano de 2025.

Mas a pioneira ideia da vereadora Nádia ainda proíbe camisetas regatas, blusas excessivamente decotadas ou transparentes. A menos que estejam tapadas por blazer, casaco ou outra roupa que assegure a formalidade que o ambiente exige. E neste circo de besteira, ainda estarão restritos acessórios como bonés, chapéus ou similares, faixas, broches, bandeiras com mastros ou adereços que configurem propaganda político-partidária, autopromoção pessoal ou proselitismo religioso.

E já que não tem nada de mais sério para debater sobre o desenvolvimento de Porto Alegre, o tal "Código de Vestimenta" será fiscalizado pela presidência da casa. E uma vez que alguém não estiver adequado às normas de vestimentas será solicitado o ajuste necessário. Pensam que terminou? Nada. Quem insistir em não acatar os termos da resolução deverá se retirar ou será retirado do plenário. E estará sujeito à sindicância se for reincidente.

Como foi mencionado nos grupos de whats em que o assunto ridículo está sendo debatido, "não há o que não haja", ou "faltou dizer que as meninas devem vestir rosa e os meninos azul". Enquanto isso, a cidade segue atolada de problemas.

Autor
Márcia Fernanda Peçanha Martins é jornalista, formada pela Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), militante de movimentos sociais e feminista. Trabalhou no Jornal do Comércio, onde iniciou sua carreira profissional, e teve passagens por Zero Hora, Correio do Povo, na reportagem das editorias de Economia e Geral, e em assessorias de Comunicação Social empresariais e governamentais. Escritora, com poesias publicadas em diversas antologias, ex-diretora do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio Grande do Sul (Sindjors) e presidenta do Conselho Municipal dos Direitos da Mulher de Porto Alegre (COMDIM/POA) na gestão 2019/2021. E-mail para contato: [email protected]

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