Vestígios de Outono

Por José Antônio Moraes de Oliveira

"A maior parte da nossa memória está longe de nós".

Marcel Proust.

Em seu refúgio em Paris e isolado dos sons e barulhos das ruas, Marcel Proust revisitava os Outonos da infância em sua fictícia Combray. Desde então, ficou difícil, talvez impossível para o aprendiz de escritor se aventurar sobre o Tempo e Esquecimento, sem recorrer à busca da memória como recriadora do passado. Quando percorrer o caminho de Guermantes, ao invés das lembranças venturosas, tropeçamos em estranhamentos e incertezas de uma vida sem sonhos.

***

Os caminhos proustianos de Outonos são marcados por símbolos e imagens de tempos repassados. Começam em uma alameda de plátanos, que deságua em uma praça forrada por folhas mortas, que serão levadas pelo primeiro vento. Ao dobrar a esquina da minha rua, um músico toca ao violino uma canção que acorda vozes esquecidas.                                                   

Mesmo depois do tempo passar, sobraram vestígios da antiga ladeira pavimentada por pedras de granito cinzento. Os sobrados brancos e as casas porta-e-janela foram apagadas, mas alguns teimosos jacarandás continuam floridos, lembrando amores mal resolvidos e dos queridos que desapareceram sem avisar.                     

Em outro lugar mais além, um menino tenta gravar suas iniciais nas lajes de ardósia rosa, usando um prego enferrujado. Mas a paisagem se transforma e não vejo mais calçadas cobertas por flores roxas. Meu olhar ao Outono procura por cenários de outras Primaveras, que ficavam mais distante a cada passo que dava.  Agora, resta este céu outonal, com uma luz dourada embalada por palavras de antigamente. Logo chega o lamurioso toque dos sinos da Igreja de Santa Terezinha, onde um menino que não consegue chorar, olha com espanto as flores azuis e brancas que cobrem o chão da capela onde o pai foi velado.

***

O Tempo sabe ser enganador, manipulando nossas lembranças e reminiscências. Os anos já se foram, os cabelos banquearam e quando o filho pergunta como era o passado, só sabemos dizer:

 "- Não lembro mais como foi, mas não deve ter sido como lembro".

***

 

 

Autor
José Antônio Moraes de Oliveira é formado em Jornalismo e Filosofia e tem passagens pelo Jornal A Hora, Jornal do Comércio e Correio do Povo. Trocou o Jornalismo pela Publicidade para produzir anúncios na MPM Propaganda para Ipiranga de Petróleo, Lojas Renner, Embratur e American Airlines. Foi também diretor de Comunicação do Grupo Iochpe e cofundador do CENP, que estabeleceu normas-padrão para as agências de Publicidade. Escreveu o livro 'Entre Dois Verões', com crônicas sobre sua infância e adolescência na fazenda dos avós e na Porto Alegre dos velhos tempos. E-mail para contato: [email protected]

Comentários