'Lei do Mandante': "A dúvida é com relação aos pequenos clubes", destaca Fernando Trein

No último conteúdo da série especial, a reportagem de Coletiva.net conversou com o professor da ESPM-Sul, especialista em Marketing Esportivo

Nova legislação impactará também as negociações no Marketing Esportivo - Reprodução/edie.net

O futebol está prestes a sofrer uma mudança nas negociações de transmissão. Isso porque o Projeto de Lei (PL) 2336/2021 que altera a definição de quem escolhe a empresa que fará a cobertura dos jogos, está para sanção presidencial. Atualmente, esse é um acerto entre os dois times que se enfrentam. Conhecida como 'Lei do Mandante', a proposta prevê que esta negociação deva ser feita apenas pelo time que joga em casa. A data-limite para a decisão, conforme o site do Senado Federal, é nesta sexta-feira, 17. 

Com o objetivo de esclarecer sobre o assunto e verificar a opinião dos personagens mais impactados por ele, o Coletiva.net produziu uma série especial sobre o tema. O conteúdo final traz a avaliação da Academia. Para tanto, a reportagem do portal conversou com  o professor da Escola Superior de Propaganda e Marketing de Porto Alegre (ESPM-Sul) Fernando Trein. Administrador graduado pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), especialista em Marketing Esportivo pela University of California e mestre em Gestão de Serviços pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Trein também ministrou o módulo Gestão de Eventos e Arenas Esportivas na CBF Academy.

Fernando Trein, professor da ESPM-Sul

Crédito: Reprodução/Linkedin

 

Tema polêmico e preocupação com os clubes pequenos

Para o estudioso, a proposta é polêmica, tanto que está restrita ao futebol. "Os demais esportes que, pela lógica, poderiam adotar a Lei, por exemplo, equipes de vôlei, a Liga Nacional de Basquete, a Liga Nacional de Futsal, por enquanto ainda não têm isso". Ele acredita, assim, que a aplicação na modalidade será um teste para ver se funciona. 

Trein defende que, em um primeiro momento, a medida afetará, em termos financeiros, principalmente os grandes clubes como Flamengo, Corinthians, e a dupla Gre-Nal - que tem torcedores espalhados em diversos pontos do Brasil. Pois eles têm a possibilidade de negociar diretamente os jogos e, de alguma forma, impactar os torcedores. 

Não necessariamente na TV aberta, mas, de certa forma, é uma alternativa ao modelo que se tem hoje. A dúvida dele está em relação às equipes que têm os torcedores concentrados em um local, "mas, principalmente, naqueles clubes médios e pequenos, que não vão ter essa força para conseguir negociar, por exemplo, os seus jogos, como mandante. Então, será algo bem complexo".

Para ilustrar, ele faz um resgate histórico e compara com as placas de publicidade estática em volta do campo. Atualmente, os patrocinadores que desejam expor ali as marcas fecham contrato diretamente com a organizadora da competição, por exemplo, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF). 

Antigamente, negociavam diretamente com os times a cada jogo. "Se o Inter, por exemplo, enfrentasse o Flamengo, o time carioca era um 'trem pagador', uma forma de ganhar muito dinheiro. A questão é que tu nem sempre enfrenta o Flamengo. Então daqui a pouco tu vais pegar um time que não tem tanta projeção assim. Fica aquela dúvida, será que aí vai ter interesse de alguém transmitir o jogo?".

Seguindo esta linha de raciocínio, ele demonstra a preocupação com os clubes médios e pequenos, se conseguirão vender as transmissões. Na legislação vigente, ao ingressarem em uma competição que já está organizada e já tem os direitos de transmissão comercializados, eles recebem uma cota.  

Mais democrático em tese, mas e na prática?

Conforme o especialista, em tese, o acesso à divulgação do esporte é para ser mais democrático, no entanto, ele não tem certeza se isso ocorrerá. Um dos pontos levantados é que os times de menor escalão precisam que os torcedores frequentem os estádios.

"Em um primeiro momento, a gente entende que ela vai democratizar. Será que isso realmente vai ser a possibilidade de um faturamento melhor para esses clubes? Essa dúvida persistirá e a gente terá que acompanhar para ver se é verdadeiro." Talvez, segundo ele, seja preciso fazer alguns ajustes na norma depois de colocada em prática.

O docente também é criterioso em relação à possibilidade do surgimento de canais de Comunicação e à ampliação da distribuição das partidas. Isso porque ele acredita que isso já vem acontecendo mesmo sem a lei. Diferentes times têm criado suas próprias televisões e rádios. 

"Mas claro, como existe um contrato com a Rede Globo, os clubes têm a impossibilidade de gerar algum tipo de imagem, comercializar os direitos de transmissão, jogar na internet para atingir aquele torcedor mais distante." De certa forma, então, esta ação acontece com o pay per view. Ele é uma forma de alcançar estes torcedores e o clube também é remunerado a partir das assinaturas feitas. 

Ele não descarta, no entanto, que a 'Lei do Mandante' acentue este processo. Contudo, ele lembra que, para fazer um jogo com boa transmissão, é preciso uma boa estrutura, o que requer investimento financeiro. Além disso, a internet não é uniforme e estável em todas as cidades no Brasil. 

Para finalizar, Fernando Trein apresenta um ponto que ele acredita que merece ser melhor debatido. Para ele, a Lei impactará futuramente na gestão das equipes. "Os clubes terão de ser melhores geridos neste aspectos e aí, sem dúvida alguma, fazer algum tipo de melhoria bastante ampla nesse caminho", finalizou.

Especial 'Lei do Mandante'

No primeiro conteúdo, o advogado Roberto Schultz, que atua com Direito focado em Comunicação, definiu as modificações. Já no segundo, o portal ouviu representantes das emissoras de televisão de Porto Alegre e dos clubes de futebol que disputam a primeira divisão do Campeonato Brasileiro. No terceiro texto, a conversa foi com o vice-presidente da Associação dos Cronistas Esportivos Gaúchos (Aceg RS), Rogério Amaral.

Confira as outras matérias da série especial:

'Lei do Mandante': o que emissoras e clubes pensam sobre a proposta

'Lei do Mandante': dono da casa decide quem transmite as partidas

'Lei do Mandante': Aceg RS é "extremamente favorável"

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