César Cidade Dias: O dono da bola

Comentarista esportivo e youtuber, ele tem com o Grêmio uma história de amor passada de geração em geração

Prestes a completar 53 anos, no próximo 9 de agosto, César Cidade Dias, ou apenas CCD, faz da paixão pelo Grêmio Foot-Ball Porto Alegrense seu instrumento de trabalho. Na Rede Bandeirantes desde 2016, atua como comentarista esportivo no programa Donos da Bola no rádio e na televisão. Além disso, desde 2013, mantém o canal no YouTube com conteúdos relacionados ao time do coração, e que, neste momento, conta com a audiência de mais de 187 mil inscritos. Em julho, fez sua estreia no universo da literatura ao lançar o livro 'A Minha Cadeira Azul e outros causos de vestiário, lembranças de arquibancada e crônicas tricolores'.

Natural de Porto Alegre, passou grande parte da infância e adolescência na Zona Sul da capital. Transitou entre os bairros Vila Assunção, Jardim Isabel e Guarujá. Neste último, morou apenas com o genitor, após a separação dos pais. Com ambos, tem dois irmãos, a mais velha Christina Dias, professora e autora de livros infantis, e o mais novo Carlos Cidade Dias, advogado. "Notou que todos são CCD?", brinca. Por parte de pai, ainda tem um irmão, Lucas, de 22 anos. Há três anos separado, é pai do Felipe, de 21 anos, estudante de Direito, e Guilherme, de 16, que deseja ser jornalista esportivo. 

Por compartilharem dos mesmos gostos, o mais novo costuma ser seu maior parceiro, mas uma coisa tem o poder de unir o trio: o jiu-jitsu. O esporte surgiu durante um momento muito delicado profissional do comentarista, e desde então passou a fazer parte da rotina. "É um esporte que te ensina principalmente a pensar. Vai muito além de uma luta. Não é chegar e dar socos na parede", defende. O prazer de praticar levou a matricular os filhos aos quatro anos de idade. Felipe não pratica mais, já Guilherme permanece firme e acabou nutrindo um fascínio pelo MMA, modalidade não muito apreciada pelo comentarista.

A relação de amor

O forte elo com o Grêmio iniciou com o avô paterno, Fernando Camargo Dias, que foi dirigente do time entre as décadas de 1940 e 1950. Como advogado, esteve à frente do processo de desapropriação do terreno que abrigaria o estádio Olímpico. "O vô chegou a bater de porta em porta para conversar com as famílias", conta. Criado nesse ambiente, seu pai, Cesar Dias Neto, seguiu os mesmos passos do patriarca ao se formar em Direito e assumir o posto no conselho do clube no final dos anos 1960. Logo em seguida, assumiu como dirigente e assim permaneceu até os anos 1990. 

Para CCD, a história de amor com o Grêmio começou a partir do momento que passou a acompanhar o pai em reuniões e, claro, nos jogos. A rotina geralmente era a mesma, após visitar o avô materno, Carlos Alberto Callage Cidade - advogado e ex-dirigente do Sport Club Internacional - no bairro Menino Deus. Ficava à espera de seu pai, que dali partia para o estádio. Das arquibancadas, acompanhava tudo, treinos e toda movimentação das pessoas que ali trabalhavam. Cresceu convivendo com grandes nomes do clube, entre eles os ex-presidentes Fábio Koff e Paulo Odone. 

Um dos momentos mais marcantes foi a primeira vez que colocou os pés no Olímpico, em 1977, para assistir a um Grenal. "É tudo muito vivo na minha cabeça. Lembro exatamente aonde meu pai estava sentado, a quantidade de pessoas. Eu só tinha sete anos", comenta. Inclusive, a passagem deu origem à crônica Minha Cadeira Azul, que está em seu livro. Mas, aos poucos, cada lembrança foi sendo apagada da memória de seu pai, que durante 12 anos conviveu com o mal de Alzheimer e faleceu em 2020. "Chegou um momento que ele já não lembrava mais de mim, mas se eu cantava o hino do Grêmio, ele cantava junto", lembra. 

Mais do que a parceria, a ausência de ter com quem conversar e trocar uma ideia mais consistente é o que mais lhe faz falta. "Eu tinha uma dependência intelectual dele. A gente falava sobre tudo. Ele me fazia refletir. É uma pena que ele não teve a oportunidade de ver o cara que ele construiu", lamenta. Toda história de amor conta também com capítulos ruins. Assim foi a sua passagem como dirigente e diretor de futebol. A saída em 2011 ficou marcada pelo episódio da volta do Ronaldinho Gaúcho dada como certa, mas que acabou não acontecendo. "Minha história não é grandiosa como a do meu pai e avô, mas eu seria uma pessoa frustrada se não tentasse", salienta.

A chegada da Comunicação

Vindo de uma família de advogados, que incluem avós paterno e materno, pai e mãe - Magda Cidade funcionária do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TFR4) -, tudo levava a crer que também vestiria uma toga. Contudo, quis o destino que seu caminho tomasse outro rumo. Apesar de ter iniciado a faculdade de Direito, não conseguiu ir até o fim. Sem saber exatamente o que fazer, decidiu apostar no que mais conhecia, que era futebol, aliado à novidade da época, a internet. Assim nasceu o portal Final Esportes, em 1998.

No formato de jornal eletrônico, o site trazia notícias da dupla Grenal, bem como de campeonatos de esportes amadores de Porto Alegre. Com o avanço da banda larga e das redes sociais, o que antes se sustentava, passou a ser obsoleto em pouco tempo. "O portal foi perdendo valor. Demorei muito para perceber que as coisas tinham mudado. Por isso, quebrei", relata. Além do portal, a empresa também atuava na área de marketing e permaneceu até 2013.

A queda foi dolorida e trouxe muitos problemas, inclusive financeiros, mas foi em 2016 que tudo começou a mudar. A convite do jornalista Ribeiro Neto, encarou pela primeira vez o desafio de ser comentarista no programa Apito Final, da Rádio Bandeirantes. "Nunca vou me esquecer daquele 11 de fevereiro de 2016. Achei que a minha vida não tinha mais futuro. Posso dizer que nasci de novo", revela. A chegada da nova fase não podia ser em um lugar mais fascinante para o comunicador: o rádio. O aparelho está em cada cômodo da sua casa. O que era apenas uma participação acabou virando uma proposta definitiva para fazer parte da programação esportiva da emissora. 

Desde então, já atuou em diferentes atrações, como o 'Programa de Todos os Esportes', que valorizava as categorias amadoras. Já como apresentador, esteve à frente do 'Mundo dos Esportes', que cobria diferentes modalidades, que iam do beach tênis ao futebol americano. Ao lado do jornalista e amigo Diego Casagrande, apresentou o 'Noventa Minutos'. Há pouco mais de dois anos, sob o comando do jornalista Leonardo Meneghetti, forma o time do 'Donos da Bola', juntamente a Fabiano Baldasso, Ribeiro Neto e João Batista Filho.

A exposição foi essencial para o seu crescimento nas redes sociais. Além do canal no Youtube, em 2021 criou ao lado de Baldasso o podcast 'Debate Raiz', com episódios que vão ao ar duas vezes por semana. Em maio deste ano, a atração ganhou um novo integrante, o jornalista Vagner Martins, o Vaguinha, que desde então medeia o debate da dupla. Para CCD, as empresas de comunicação ganhariam muito se permitissem que seus profissionais produzissem conteúdos independentes. "As redes sociais precisam ser vistas como uma remuneração do comunicador. Esse é o futuro da comunicação", argumenta.

O caderno sempre foi seu maior companheiro 

O Grêmio e o rádio não são os únicos a preencher seu coração. O hábito de escrever o acompanha desde muito jovem. Aliás, é possível perceber que, a cada vídeo do seu canal, ele está acompanhado de um caderno e uma caneta. Quase que como um diário, tudo que achava interessante virava um texto. Ainda adolescente, resolveu jogar fora todas as poesias que havia escrito só porque "nunca gostou de se ler", como ele mesmo diz. Mas o costume continuou e, ao longo do tempo, foi acumulando histórias, até virar um livro.

Contando com a ajuda da irmã, que possui uma editora, lançou em julho deste ano a obra 'A Minha Cadeira Azul e outros causos de vestiário, lembranças de arquibancada e crônicas tricolores'. "Relutei muito, mas a insistência da Chris me dobrou", conta. Foi dela também a ideia do título. Durante muitos anos, uma briga os afastou, mas a reconciliação veio carregada de emoção. Logo que iniciou o processo de mudança do Olímpico para a Arena, o clube passou a vender as cadeiras do estádio. A alegria da reconciliação veio acompanhada do presente mais inesquecível. "A Chris me deu uma cadeira e, desse momento, nasceu a crônica A Minha Cadeira Azul", destaca. Ao ler o material, a escritora, além de se emocionar, não teve dúvida que daria o nome da obra. O lançamento aconteceu há mais de um mês, mas até o momento ele não leu, porque simplesmente não gosta de se ler. 

Para ele, a publicação vai muito além de entrar para o universo da Literatura. A preocupação com o rumo que a cultura tomou nos últimos anos o levou a querer trabalhar para ajudar as pessoas a se aproximarem mais dos livros, das artes, de tudo que as façam refletir. A gana de aprender é o que o move. "A sensação que eu tenho é que tenho 20 anos, então, quero aprender cada dia mais. Vivemos a era do 'eu sei', mas a frase que eu mais uso é o 'não sei', pois é única forma de aprender", enfatiza. 

Levar isso como lema o ajuda em todos os aspectos da vida. Aos filhos, tenta passar a ideia de que podem ser o quiserem, basta que tentem e que se arrisquem. Ao cair, e levantar algumas vezes, aprendeu que a derrota ensina mais que a vitória, e por onde passa faz questão de falar sobre isso, mesmo que receba muitas críticas. A isso responde com trabalho, aliás, muito trabalho. "Amo o que faço! Não sei se tem algum momento que não estou fazendo nada, acho que só quando estou dormindo", brinca. Ao tentar se definir, a única coisa que lhe vem à cabeça é o elogio que mais recebe das pessoas que acompanham a sua trajetória: "Cara, tu és um baita gremista", finaliza.

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