Eugênio Corrêa: A arte de se relacionar

Na bagagem, não faltam vitórias, Planeta Atlântida e Cais Embarcadero que o digam, mas tudo acompanhado de muita criatividade

Eugênio Corrêa, um dos criadores do Cais Embarcadero - Arquivo Pessoal

Amor pelo que faz, relacionamentos, pesquisas, pitadas de persistência e uma grande dose de criatividade. Esses ingredientes podem ter consequências óbvias e uma delas é o sucesso. Eugênio Corrêa é uma boa prova disso. Sócio da DC Set há quase 25 anos - ao lado de Cicão Chies e Dody Serena -, ele se diz uma pessoa da paz, que tenta contemporizar as relações, pois busca apenas viver em harmonia. "Para relacionamentos em geral, é preciso ter dom, estômago e até um pouco de esforço físico", resume o publicitário.

Agora, se tem algo que faz essa pessoa serena ficar agitada, empolgada e os olhos se encherem de brilho é falar sobre a arte de vender. Aliás, apesar de formado em Publicidade e Propaganda pela Famecos, faculdade que começou cursando Relações Públicas e desejando migrar logo para o Jornalismo, é categórico: "Se me perguntarem, meu ofício é corretor de anúncios". Ele explica que começou a carreira como contato publicitário na rádio Cidade (quando esta pertencia ao Jornal do Brasil), passou pelo SBT e foi parar na Zero Hora. É do impresso do Grupo RBS que ele carrega as melhores lembranças pelo tanto que aprendeu.

Segundo o publicitário, as referências que teve no período o moldaram profissionalmente. Nomes como os de Esperidião Curi e Madruga Duarte surgem para registrar a gratidão do que aprendeu com os mestres da área comercial. Atualmente, o criador do projeto Cais Embarcadero - espaço inaugurado recentemente no Cais Mauá, no Centro Histórico de Porto Alegre - está totalmente voltado à novidade, mas, apesar de se envolver completamente com a gestão e o operacional do lugar, é a comercialização que faz o coração bater. 

Um jovem dinossauro

Gastar sola de sapato é premissa básica para quem trabalha com vendas e relacionamentos, e Eugênio nunca fez diferente disso. Embora sempre respeitasse a hierarquia das agências de propaganda, fazia questão de visitar os anunciantes. Inclusive, foi com essa postura que criou amizade com os atuais sócios, que eram seus clientes da época de ZH. Aliás, quando deixou o jornal, abriu com dois amigos, Luiz Armando Oliveira, o Arroz, e Raul Azevedo - a Mercado Sul, uma representante de veículos, especialmente para o Interior e outros estados. O empreendimento durou cerca de dois anos até ser integrado à DC Set.

E nem só de contatos se faz uma relação comercial. Na opinião dele, "e modéstia à parte", como frisa, acha que tem "um pouco de talento para criatividade, algo que está no DNA". Ao não se considerar um cara tecnológico, ele ainda brinca: "Não sou um investidor de startups, mal sei o que é uma fintech. Sou um dinossauro, admito". Apesar dos 59 anos e dos cabelos completamente brancos, admite que tem a  cabeça extremamente aberta aos jovens, gosta de ouvi-los, saber o que acontece ao redor e surfar na onda do que faz a cabeça da nova geração. Outro grande feito da carreira é ser um dos criadores do Planeta Atlântida, evento com o qual, hoje em dia, envolve-se principalmente no processo criativo dos conteúdos e das atrações. 

A propósito, ter um filho de 15 anos ajuda muito, garante o publicitário. "Ele é a minha maior fonte de inspiração. É a coisa mais forte que tenho na vida, sem dúvida alguma", diz, não sem antes dar uma pausa na fala, emocionado ao citar o que sente por Frederico, fruto do primeiro casamento. O adolescente, que cresceu em meio a eventos devido ao envolvimento dos pais com a área, mostra alguns interesses pela Comunicação. "Ele ainda não sabe exatamente o que quer. Tem talento para relações, apesar de ser bem tímido, como eu (aqui,  confessa que a característica fica mais evidente se, por acaso, precisar falar para uma plateia grande: "Dou uma travada até hoje!"). Ico, como é chamado pela família, gosta de acompanhar o pai nas atividades e tem muito orgulho dos feitos, mas Eugênio conta que faz questão de levá-lo no Embarcadero, por exemplo, em horário fora do convencional, para que veja que aquilo é trabalho, não apenas diversão. 

Vida de entretenimento

Além da relação com os sócios ter começado em ZH, quando atuava na Mercado Sul passou a vender patrocínios para os shows que a DC Set promovia. O trio se aproximar, então, foi quase natural. No começo, tinha participação na área comercial, mas com o crescimento da empresa montaram uma operação dela gaúcha, onde Eugênio, então, cuidava de tudo que era preciso. Aqui no Estado, além dos diversos shows trazidos, a empresa chegou a administrar alguns bingos.

O entretenimento não parou por aí. Casas noturnas também fazem parte da bagagem empreendedora dele. Ibiza, no Litoral Norte, e Liquid, na Capital, tiveram seu nome na concepção e por alguns anos. Mas ainda era pouco. O Planeta Atlântida nasceu para celebrar os 20 anos da rádio do Grupo RBS, mas ganhou força e foi um divisor de águas no entretenimento do Rio Grande do Sul. "Hoje, ele tem uma estrutura que me permite não estar mais no dia a dia, mas lembro que, na primeira edição, vendi desde as carrocinhas de cachorro-quente, algodão-doce e pipoca, até o contrato da Rita Lee", recorda, com muito orgulho. Desse tempo, apesar de saber que colocou toda sua energia para criar algo incrível, lembra do parceiro de evento, Renato Sirotsky, falecido em 2008. "Ele  colocou a alma e o coração no Planeta."

As relações com a praia de Atlântida não ficam só por conta do festival de música. Seus pais, o advogado e funcionário do Banco do Brasil Odalgiro e a dona de casa Alzira, tinham uma casa lá, que ficou para o irmão mais velho, Péricles, dono da incorporadora CFL e 18 anos mais velho que o caçula. Então, foi na praia do Litoral Norte que Eugênio passou muitos verões. Além disso, a atual sogra também tem casa lá e, segundo suas palavras, Ico vive pedindo para ir para Atlântida. "Meus sócios moram em São Paulo e veraneiam lá. Então, é um lugar de muitas relações", conta. Considerando-se um homem do mar e do sol, que ama lugares paradisíacos, ainda tem outro refúgio, uma casa em Governador Celso Ramos, Santa Catarina.

O novo filho

Se o Planeta Atlântida é um filho que já caminha quase sozinho, o Cais Embarcadero ainda está sendo gestado. Eugênio acompanha o projeto do Cais Mauá, que nasceu ainda no governo de Yeda Crusius, desde o início e sempre alimentou o desejo de ser o player de entretenimento, especialmente o que envolvesse Gastronomia, Cultura e Turismo. Obcecado pela possibilidade, passou os últimos 10 anos pesquisando locais inspiradores. "Meu turismo era focado em docas. Todo mundo conhece as mais famosas, como de Buenos Aires, Barcelona, Lisboa. Eu fui pra Gênova, Medelín, Belém do Pará, Rosário, vi doca em tudo quanto é canto", detalha.

O segundo passo foi "tropicalizar ideias", como diz, para adequar ao que Porto Alegre teria a capacidade de absorver, tanto em tamanho quanto em hábitos. "Ganhei uma boa experiência", resume ele. A persistência deu certo. A DC Set foi convidada pelo governador Eduardo Leite e pelo procurador-geral do Estado, Eduardo Cunha da Costa, a dar continuidade ao projeto do Cais Embarcadero. Então, nos últimos cinco anos se dedica muito a fazer e acontecer com o novo filho. 

Com o pé no mundo

Fora a busca pelas docas, tem outro motivo que já fez Eugênio colocar o pé no mundo: o Grêmio. Tanto é que, em janeiro de 2017, fez uma trip para a Tailândia, mas por conta de uma conexão passou três dias em Dubai. Ao final do mesmo ano, o tricolor gaúcho disputou o Campeonato Mundial no país árabe e o publicitário voltou para lá. Apesar da paixão, ele explica que ela se limita ao time do coração e nem tanto pelo futebol em si. Além disso, faz questão de frisar o tamanho do respeito que tem pela instituição Sport Club Internacional, com a qual mantém ótimas relações comerciais até hoje. 

Ele nem gosta de participar dos famosos grupos de WhatsApp se estes tiverem apenas gremistas, pois não vê a menor graça. Prefere quando há representantes das duas torcidas rivais para que haja brincadeiras saudáveis de ambos os lados. A paixão tricolor, porém, é absorvida por Ico em intensidade significativamente menor. O filho não tem o hábito de acompanhar os jogos. "Uma das minhas frustrações é ter duas cadeiras na Arena, onde sonhava assistir às partidas com ele, mas não se concretiza muito. Ainda tenho esperança dele se interessar mais", lamenta o torcedor.

Colocar o pé no mundo está entre os principais lazeres. Ele não sabe dizer quantos lugares conhece e admite que poucos são os que voltaria ciclicamente. A Itália, local que já desbravou muito bem, o encanta, assim como a Califórnia, e Londres e Nova Iorque são destinos que, profissionalmente, é sempre bom voltar para se inspirar. E mesmo não gostando de frio, tem um país pelo qual é apaixonado e, não fosse o cenário econômico tão difícil, consideraria viver na aposentadoria: Argentina.

Nada de outro mundo

Criado no bairro Bom Fim, Eugênio perdeu os pais cedo e precisou "se virar" desde então. Como legado, ficou a retidão deles e a característica de ser bastante família. Não é muito de ver séries e já foi mais noveleiro, mas, em virtude da falta de rotina, prefere filmes, desde que não sejam de Ficção. Na vida musical, até gosta de Pop e Rock, mas o que faz bem ao ouvido e ao coração é o Bolero. Fã do artista mexicano Luis Miguel, a série da Netflix que conta a vida dele é uma das exceções que para para assistir. Momento de lazer mesmo é traduzido na boa e velha carpeta, hábito que ganha bastante espaço na rotina.

Amante de uma boa culinária, por orientações médicas, está proibido de comer carboidratos, que são os preferidos, como massas e risotos, mas se força, então, a degustar de basicamente saladas e proteínas. Além disso, "depois de velho" passou a gostar muito de doce. A bebida preferida é vinho, ao ponto de fazer passeios de enoturismo. Também voltou a apreciar cerveja com a ascensão das artesanais, mas não pode tomar, afinal, "cerveja é pão líquido". 

E é nesse cenário, contando sobre as preferências, que Eugênio se descreve, com fala muito serena, como alguém que não admite injustiças, que ama Comunicação e tudo o que faz nela. "Uma pessoa simples, de hábitos simples, mas que tem ambições. Apaixonado por coisas legais da vida, que tem muitos amigos, mas também se sente sozinho às vezes. Ou seja, nada do outro mundo."

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