Louinnie Dandara: Família é música para os ouvidos

Ritmo dos tambores embala e cadencia a rotina agitada da publicitária e gerente de Contas da agência Live

As lembranças dos churrascos, junto com os sambas de roda que aconteciam na casa do já falecido avô, retratam uma infância boa e saudável na vida de Louinnie Dandara. Pode ser visto no sorriso, nos gestos e na empolgação, em cada momento verbalizado sobre aquele tempo. Afinal de contas, até hoje, o ritmo dos tambores embala e cadencia a rotina agitada da publicitária e gerente de Contas da agência Live.

Nascida e criada na Vila do IAPI, Zona Norte de Porto Alegre, Louinnie aprendeu desde nova sobre ativismo cultural. Família: esse é o principal significado para a filha do meio, que levanta todos os dias para ser o orgulho dos pais, a psicóloga Leriane Teresinha e o também publicitário e músico Paulo Ronald. Aliás, a fruta não poderia cair longe do pé. Ainda criança, decidiu que queria exercer a mesma profissão do pai.

Ao recordar o trabalho dele, observa que a forma como se fazia propaganda era diferente, e foi isso que a encantou. Na época, os computadores não eram uma realidade nas agências, onde se exigia muito mais da criatividade dos profissionais - por volta dos anos 1990, o pai desempenhava a função de arte-finalista. "Essa vivência com ele me influenciou muito", diz. Mesmo jovem demais para tomar decisões, pensou: "Serei uma publicitária".

Seguir a carreira não seria o suficiente, pois queria ir além e ser um diferencial no segmento. Um dos principais objetivos era promover, cada vez mais, pessoas negras no cenário, tanto para serem os criadores de campanhas, quanto para atuarem nelas. Há 14 anos no mercado, hoje, Louinnie desempenha um papel na Associação Riograndense de Propaganda (ARP) como conselheira, a fim de incluir diversas ideias voltadas ao seu propósito. Além disso, é especialista em Gestão de Pessoas e Negócios de Moda.

Quando jovens, seus pais foram ativistas da causa racial no Rio Grande do Sul e fizeram parte de grupos tradicionais, como 'Tição' e 'Razão Negra', fundado pelo poeta gaúcho Oliveira Silveira. Ainda moça, foi presenteada com o livro 'Menina Bonita do Laço de Fita', obra literária escrita pela jornalista Ana Maria Machado, que trata sobre autoestima da criança negra. O livro foi fundamental para entender o orgulho das raízes afro-brasileiras e passar a se amar ainda mais como mulher e preta.

Positiva e alto-astral

Vaidosa, a sagitariana separa os sábados para cuidar da beleza. Trata-se de um dia especial, pois acredita que durante a semana carrega o peso dos afazeres profissionais e, por isso, o momento serve para relaxar. "Faço as unhas, cabelo, sobrancelhas. É como se eu pudesse tirar as correntes das costas", revela. Nas horas vagas, quando não está em festas, senta para assistir a filmes e séries.

A prática da caminhada é um exercício físico que gosta de praticar, não para estética, mas porque faz bem à saúde. Positiva e alto-astral, Louinnie faz piadas e dá risadas em momentos inapropriados, ocasiões essas que já a fizeram levar chamadas de atenção: "Ei, esse não é um momento bom, estamos em reunião", cita de exemplo, aos risos.

Uma curiosidade é que Louinnie tem medo de pets e, por isso, não os adota. No entanto, é viciada no jogo The Sims - game eletrônico de simulação de vida real. No ambiente virtual, ela se diverte ao recriar famílias, inclusive com animais de estimação. Ali, até pode refazer a relação do polêmico ex-casal de cantores norte-americanos Rihanna e Drake. "Divirto-me mesmo, faço diversas coisas", comenta, divertindo-se de novo.

Na época de prestar vestibular, ela estava em dúvida se faria mesmo Publicidade ou Música, porém preferiu o caminho da Comunicação. Cantar se tornou a segunda paixão. Louinnie mantém vídeos frequentes em sua conta no Instagram entoando diversas músicas. Além do mais, trata-se de uma boa percussionista. "Sou metida e brabona, entro em uma roda de samba, pego o microfone, pandeiro, rebolo e saio fazendo som."

Tradição e União

"Essa família é muito unida", conta, como sendo um dos principais legados deixados pelo avô, pois em todos os finais de semana os netos frequentavam a casa que fica no município de Cachoeirinha. Por lá, irmãos, primos e outros parentes se reuniam para tomar café e prestigiar costumes como comer frutas do pé e beber suco de cana. Na residência, há um terreno de terra vermelha, onde ela e outras crianças cavavam o chão à procura de minhocas. "Éramos atentadas", confessa.

Até hoje, nos aniversários, a pessoa que celebra anos de vida recebe um sonoro "parabéns a você" em ritmo de samba, com direito a pedir uma canção aos músicos. Ao final, também é tradição que todos cantem um lema versado pelo grupo Fundo de Quintal, que diz: "Quando a idade chegar, não deixe transparecer rancor. Se a pele enrugar, sorria, são rugas de amor".

Mesmo anos depois da morte do patriarca, data da qual não se recorda, os costumes da reunião familiar continuam, como um legado. Uma vez por mês acontece a 'Confraria das Primas', uma janta na casa de uma das integrantes, encontro vivenciado somente pelas mulheres. Além disso, elas frequentam shows de grupos musicais. O gênero? "O samba e o pagode embalam aquela família."

Com a chegada da pandemia, os encontros diminuíram, mesmo assim, a união não deixou de existir. "Até porque muitos tiveram filhos e a rotina mudou, mas sempre damos um jeito de nos encontrar", ressalta. Louinnie pondera também que a forte conexão entre os parentes se dá pelo fato de as mulheres serem uma fortaleza para todos os integrantes. Entretanto, considera um fato triste, pois mostra a realidade das negras e solteiras na sociedade. "Por isso, fazemos questão de estar sempre juntas", reflete.

O momento em família não se refere somente a um "terminou o churrasco e virou samba". Na visão da Louinnie, trata-se, também, de um grande manifesto cultural e preservação, pois as músicas cantadas falam de amor, autoconhecimento, autoestima, carinho, religião, etc. Foram nesses encontros que surgiram diversos talentos, como seu irmão mais novo, que se tornou músico.

Ensinamentos

Quando ingressou na faculdade, na Escola de Comunicação, Artes e Design (Famecos) da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), ficou convicta que estava no caminho certo. O campus era o local onde mais frequentava, pois atuava como voluntária nos laboratórios para aprender ainda mais sobre a futura profissão. Logo no primeiro semestre, começou a trabalhar em um jornal de bairro. "Ganhava pouquinho, mas estava feliz de poder, eu mesma, comprar o meu desodorante", exalta.

No entanto, a inquietude fez mudar de ares e procurar outras oportunidades. Foi na própria universidade onde escutou diversos conselhos para o mercado de trabalho. Um colega de classe disse que Louinnie precisava mudar para o turno da noite a fim de se conectar com as pessoas que trabalham durante o dia. "Isso foi fundamental para eu entender minha profissão", ressalta. O mesmo colega também a indicou para o seu primeiro trabalho em uma agência de Publicidade.

Para a profissão, pode levar alguns ensinamentos que aprendeu na religião que frequenta, a Umbanda. Para ela, compreender mais o sentimento das pessoas é um dos fatores fundamentais para se viver em harmonia. Louinnie se define como uma mulher lutadora, que tenta de tudo para levar os preceitos da religião: "Compaixão, generosidade, amor, nunca esquecer o ponto de partida e resgate das pessoas que ficaram para trás", conta, emocionada.

Para o futuro, pretende levar todos os ensinamentos que aprendeu durante a carreira. Contudo, existem alguns mais específicos, como, por exemplo, casar e ter filhos. Apesar disso, continuar a trilhar o caminho de ser uma referência para pessoas negras e abrir portas para outras, além do desejo de crescer mais e ter uma boa rentabilidade financeira. "Eu vim para o mundo para ser feliz, nem que seja na base da porrada", finaliza. 

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