Luciane Bemfica: uma eterna inquieta

Especialista em Personal Branding, a jornalista de 52 anos está em constante evolução

Luciane Bemfica - Crédito: Carla Souza

Como uma boa jornalista, Luciane Nehme Bemfica gosta de se manter em movimento. Longe de estacionar na vida, a porto-alegrense segue plantando sementes, enquanto já colhe os frutos de uma mudança de carreira efetivada em 2016, quando se despediu de uma trajetória de 14 anos no Diário Gaúcho para desbravar uma área que ainda era pouco explorada no Brasil: o Personal Branding.

Em constante evolução, prender-se ao mesmo projeto ou método de atuação por muito tempo não faz o perfil de Luciane. "Não é uma questão de ambição, mas, sim, de explorar mais possibilidades e de ver outro ângulo", defende. E isso se estende até no trato da jornalista com clientes. "Não posso ver eles muito acomodados. Sempre tenho que estar provocando para estimular o crescimento da pessoa como profissional", explica.

A atuação como especialista em Personal Branding rendeu até alguns convites, incluindo o de dinamizadora no Rock in Rio Humanorama 2021 - braço educacional do festival. "Fui chamada para dar um curso on-line, dentro dessa proposta de educação deles. E isso é resultado de posicionamento, o que é muito valioso", salienta. Luciane também é integrante do diretório Personal Branding World, instituição que mapeia os profissionais que se destacam na área ao redor do mundo.

Hoje, com 52 anos, ela garante que se sente realizada e que busca todos os dias a satisfação de ouvir um cliente celebrar os resultados atingidos por meio das consultorias. "É muito difícil trabalhar a identidade do outro, é uma responsabilidade muito grande e qualquer erro também é muito grande", afirma. É por isso que o conhecimento é fundamental e isso não falta em Luciane, que acumula certificações em instituições de São Paulo, de Portugal e dos Estados Unidos.

Jornalista por acaso

Mas vamos voltar um pouco no tempo, antes de todas essas certificações. Até prestar o vestibular, a profissional nunca cogitou trilhar o caminho da Comunicação. Foi quando não conseguiu passar em Direito, que uma amiga sugeriu que Luciane se matriculasse junto com ela para Jornalismo na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). "Achava que não tinha talento nenhum, mas pensei: 'vamos ver no que dá'", conta.

Embora tenha chegado ali por um acaso, encontrou-se no Jornalismo. A primeira experiência profissional foi como estagiária no setor de Comunicação do Departamento Municipal de Água e Esgoto (DMAE) de Porto Alegre. Após a formatura, em 1994, conseguiu uma oportunidade na Agência RBS, sendo enviada para ser repórter em Blumenau, em Santa Catarina.

Ficou três anos no estado vizinho, quando retornou para ser repórter do Grupo Sinos. A experiência durou quatro anos, o que foi mais tempo do que o período no Correio do Povo, onde permaneceu por seis meses. Menos tempo ainda ela ficou no Clic RBS: "Não me dei bem com a Internet". Luciane firmou raízes mesmo no Diário Gaúcho, onde entrou em 2002 e permaneceu por 14 anos. "Fui repórter de geral, de polícia, chefe de Reportagem e depois editora", relata.

Parte um

A experiência no DG é definida por ela como "curiosa". Por ter iniciado no jornal dois anos após a fundação, Luciane experimentou o início do Jornalismo Popular. "Foi um desafio, pois não era o mundo que eu vivia. Você lida com assuntos que não são do teu universo", pontua. A jornalista ainda destaca que havia certo "preconceito" com os profissionais que trabalhavam na área, até entre os colegas. "Mas isso foi superado, até pelos números do jornal e pela relevância da causa, por ser um veículo que trouxe muitos ganhos para as comunidades", explica.

Para Luciane, era uma ótima sensação quando o Diário Gaúcho mostrava sua força para resolver até os pequenos problemas das comunidades, desde o buraco na rua até o ônibus quebrado ou a falta de médico no posto de saúde. "São coisas que, por morar em um lugar melhor, eu não sofro. Então conhecer tudo isso foi um aprendizado bacana e muito valioso para a minha carreira", relata. É por isso que, para a jornalista, os melhores elogios não vinham dos chefes, mas das pessoas que eram ajudadas pelo DG. "Esse sempre é o melhor retorno", defende.

Outra grande satisfação que Luciane tem diz respeito aos períodos como chefe de Reportagem e editora. "É ótimo quando o trabalho em equipe dá certo, quando a gente planeja uma cobertura ou uma pauta e dá certo", salienta. Para ela, a junção desses momentos menores fazem o conjunto de sucesso de uma redação, o que é muito maior do que um ganho individual.

Parte dois

Luciane considera a atuação como especialista em Personal Branding como a "parte dois" da carreira. Ela começou essa migração antes mesmo de sair do DG, em 2014, quando iniciou um MBA em Negócios Digitais no Centro Universitário Ritter dos Reis (UniRitter). "Já estava percebendo que o mercado tinha mudado, eram muitas demissões na Comunicação e me deparei tendo só uma graduação, por estar preguiçosa mesmo, acomodada", afirma.

Com a conclusão do MBA, a jornalista percebeu que tinha possibilidades que não havia enxergado até então. Era 2016 quando decidiu se despedir do Grupo RBS e levar seu conhecimento para uma nova área. Luciane projetou um modelo de consultoria individual em um mercado que praticamente não existia no Brasil até então, o da marca pessoal. Após realizar mais alguns cursos na área, em São Paulo e em Portugal, retornou ao Rio Grande do Sul já com clientes para atender. "Foi muito rápido. Eu saí do DG em setembro de 2016 e em dezembro já tinha clientes", relata.

Com foco e dedicação, o ano seguinte foi de prospecção. "Tinha que explicar para as pessoas o que era o trabalho. Hoje já não preciso, pois tem mais profissionais atuando com marca pessoal", conta. Contudo, apesar da velocidade com que Luciane entrou nesse novo universo, ela não esconde que a mudança de área foi o maior desafio profissional pelo qual passou. "Estava sozinha, sem nunca ter empreendido. Eu saí da carteira assinada e tive que aprender a matar um leão por dia, pois é outra dinâmica", explica.

Para a jornalista, foi um baque significativo ingressar em uma rotina de prospectar e atender clientes e elaborar propostas, enquanto ainda tentava fomentar informação para se manter relevante no mercado. Apesar de se considerar madura e estabilizada, ela entende que não é fácil uma migração como essa. "Então tudo que se conquista neste período é mérito da própria pessoa, pois não tem quem ajude", defende Luciane, que ainda hoje opera sozinha.

Muito bem acompanhada

Entretanto, esta solitude se limita totalmente ao cenário profissional, visto que no âmbito pessoal a jornalista está muito bem acompanhada. Além do marido, Daniel, com quem oficializou a união há seis meses, ela nutre uma ótima relação com as três irmãs - Karime, Marga e Gabriela. Filhas da dona de casa Saíde - que morreu em 2018 -, e do bancário Julio - hoje com 78 anos -, as quatro foram criadas pela mãe na maior parte do tempo, devido à rotina de viagens do pai. 

Das lembranças de infância, Luciane comenta sobre as brincadeiras na rua, andando de patins ou jogando bola, e as atividades manuais. "Eu brincava muito de boneca e gostava de fazer roupinhas para elas", afirma. Até hoje preserva a habilidade de costurar à máquina, de quando usava o equipamento da mãe para fazer as peças. "Eu era uma criança que trabalhava com as mãos. Foi uma parte muito boa da infância", conta.

Da boa relação com as irmãs, também surgiu uma aventura: uma viagem das quatro para a Europa em 2019. O quarteto ainda pretende repetir a dose neste ano, em um passeio para Minas Gerais. Para Luciane, viajar é um dos melhores investimentos que se pode ter. "Ganhamos experiência e história. É um conhecimento que ninguém te tira", afirma. Argentina, Uruguai, Chile, México, Itália e Espanha são alguns dos países por onde já passou, embora nutra um carinho especial por Lisboa, em Portugal: "sinto-me em casa".

Além das viagens, a jornalista gosta de estar acompanhada pelos livros. Ela, que não gosta de obras de ficção, prefere ler biografias. O gosto se aplica também ao Cinema, pois prefere produções documentais ou baseadas em fatos reais. Em termos de música, Luciane prefere ouvir MPB, bossa nova, rock ou canções dos anos 80. Enquanto trabalha, a música é uma das suas companhias, junto com as notícias do rádio e da televisão - hábito adquirido do tempo de repórter. "Em redação, aprendemos a nos concentrar para trabalhar mesmo com o barulho. Então estou sempre com a notícia em volta", afirma.

E o que mais?

Após mais de 20 anos nas redações, com o número de folgas limitado pela natureza da profissão, atualmente, Luciane se permite descansar aos finais de semana. "A minha rotina é mais light do que era. Não tenho carga horária para cumprir, então baseio minha agenda conforme os clientes", explica. Segundo a jornalista, como as consultorias costumam durar dois meses e meio para cada cliente, o número de atendimentos semanais é variável.

Ainda assim, ela prioriza manter alguns espaços livres na agenda, tanto para resolver pendências pessoais quanto para não trabalhar. "É importante ter esse momento de 'não-fazer'", defende. As folgas também são seu momento de ser autodidata, especialmente no que diz respeito às redes sociais. Luciane gosta de entender as dinâmicas das redes, até para evoluir no trabalho.

Para 2024, a jornalista pretende reunir seus dois livros digitais em uma obra física. Além disso, retomar os cursos presenciais também está no radar. Pensando no futuro mais distante, considerando as mudanças trazidas pela inteligência artificial e outras tecnologias, ela acredita que estará fazendo algo que nem existe ainda. Focada, persistente e resiliente - embora admita que precisa trabalhar a impaciência -, Luciane segue na busca por novas possibilidades, sempre acompanhada da pergunta que a move: "e o que mais?".

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