Nereida Vergara: Quebrando os limites

Atual editora de Rural do Correio do Povo enxerga como um divisor de águas o momento em que passou a trabalhar com a área

Era 4 de agosto de 2022 e, naquele dia da entrevista, Nereida Vergara completava 37 anos desde a formatura. Nada melhor, então, do que relembrar a trajetória durante essas quase quatro décadas de Jornalismo. E tudo isso começou com o gosto pelo desenho, que a levou a cursar Arquitetura. Exatamente isso! Porém, teve muitas dificuldades com a matemática, não gostou e acabou por trocar de curso.

Pela mesma lógica, a segunda escolha foi Publicidade e Propaganda, graduação que concluiu, é verdade, mas o fato é que a área não era tudo o que ela esperava. Entretanto, nem tudo estava perdido, porque uma outra área dentro da Comunicação Social chamou sua atenção. Foi assim que, depois de realizar uma complementação, encontrou o seu lugar e, por consequência, conquistou o diploma de Jornalismo.

Hoje, ao olhar para trás, admite que respeita muito a sua história. Realizando algumas pausas na carreira para priorizar a família e cuidar dos filhos, Fernanda e Tomás, foi nos últimos 10 anos que teve a condição de investir mais no lado profissional e, como ela diz, "melhorar-se como jornalista". Contudo, de forma alguma se arrepende do passado. Pelo contrário.

Acredita que se tornar editora de Rural no Correio do Povo chegou na hora que tinha que chegar, quando tudo o que deveria estar resolvido já está, bem como tem tempo e disposição para se dedicar à carreira. Afinal, hoje Fernanda e Tomás estão com, respectivamente, 31 e 28 anos, e nem moram mais com a mãe. Enquanto a primogênita, por trabalhar na editora Planeta, está em São Paulo, o caçula reside em Pelotas, onde realiza a graduação em Medicina Veterinária.

De Geral à Rural

Com passagens pela extinta TV Guaíba, rádio Guaíba e pelo CP, esta não é a primeira vez que trabalha no conglomerado midiático - que pertencia ao Grupo Caldas Júnior. Antes do retorno, entretanto, ainda atuou por duas vezes na redação da Zero Hora, além do Sindicato dos Técnicos do Tesouro. No regresso ao jornal, que hoje pertence à Rede Record, ficou um ano na editoria de Geral, quando um "divisor de águas" chegou e ela passou à área de Rural. "Aprendi algo novo depois dos 50 anos, revi a maneira de trabalho e a forma de encarar a profissão. Foi muito desafiador nesse adiantado da hora começar a trabalhar com um Jornalismo altamente especializado", admite.

Apesar do grande desafio, deu tudo certo e hoje comanda a editoria, sendo responsável pelo caderno histórico Correio Rural, criado em 1958. Inclusive, em 2022 conquistou um prêmio do Sindicato da Indústria de Laticínios e Produtos Derivados do Rio Grande do Sul (Sindlat-RS), com uma matéria sobre os produtores de leite no Estado. "Uma das coisas que mais me dá alegria é tentar fazer as pessoas entenderem como se dá a produção de alimentos, de onde vem, todo esse esforço e o que demanda", relata sobre o momento marcante na carreira.

Além dele, Nereida destaca, também com satisfação, quando, em 18 de novembro de 2012, escreveu uma crônica para Zero Hora sobre o fato do filho mais novo ser gay. O texto, que se chamava 'Meu filho é gay e eu estou bem', foi em resposta a uma vizinha que o encarava sempre "de cara feia" no elevador. "Isso teve uma tremenda repercussão e foi um momento muito legal", comemora.

Além da redação

Após um dia inteiro de trabalho na redação - onde participa da reunião de pauta pela manhã -, é hora de voltar pra casa e, mais precisamente, para Cleópatra, Michelangelo e Otto, seus gatos. A paixão pelos felinos é tamanha que acredita ser uma "mania intensa não poder viver sem". "Tenho um apreço muito grande por eles, porque é um animal muito querido", diz, ao relatar que possui esses pets há quase 25 anos.

Nereida ainda confessa, aos risos, que tem mania de limpeza, além de ter como hobby cuidar de plantas. Fora do trabalho, ainda gosta de ver filmes, no cinema ou em casa, e assiste de tudo um pouco: desde tramas que envolvem super-heróis e desenhos animados, até dramas e aventuras. "Só não gosto de soco e pontapé", ressalta. Entre os títulos favoritos, estão o nacional 'A Vida Invisível' e o estrangeiro 'Anna Karerina'.

Parar para ler é outra predileção da jornalista, que consome mais obras de romance, além de ensaios na área mais psicológica, assim como livros cuja temática aborde sobre criminosos. Para ela, entre as leituras que já realizou, se destacam 'A única história', do inglês Julian Barnes, e 'A ridícula ideia de nunca mais te ver', da espanhola Rosa Montero.

Com o que considera ser uma vida bem tranquila, ainda tira um tempo para fazer trilhas na natureza e adora viajar. Inclusive, a primeira vez que saiu do Brasil e rumou à Europa, em 2015, foi sozinha para Paris, quando "se sentiu empoderada (apesar de não gostar muito do termo), livre e muito forte". Mas foi dois anos depois que conheceu o destino favorito, a Cidade do México. E não para por aí: em outubro deste ano passará uma semana em Portugal.

Raízes

O plano de visitar a terrinha estava previsto para 2020, quando chegou a pandemia de Covid-19, e a obrigou a postergá-la. "Quero muito conhecer, porque está muito ligado à história da minha família", explica ela, que tem descendência portuguesa.

A filha de Sueldy, de 93 anos, não se considera apenas porto-alegrense. Mas muito! Isso porque os antepassados vivem na Capital gaúcha desde meados de 1800, enquanto apenas os avôs eram do Interior.

Com cinco sobrinhos-netos, a "irmã de sangue" de Carlos Eduardo e Rosimeri, além de Simone - que foi adotada pela família -, acredita que sempre teve uma vida boa, porque nunca enfrentou algum tipo de dificuldade, e não carrega mágoa da vida nem rancor de algo ruim. Mas isso não quer dizer que nada tenha acontecido, como é o caso da perda do pai, Valter, quando tinha 16 anos, e de quem sente muitas saudades. Entretanto, no geral, acha que "o universo me tratou a pão de ló".

Seguindo o lema "um dia de cada vez", percebe que a maior qualidade está em não guardar rancor. Isso porque, "por mais que algo tenha sido ruim, tem um momento em que perde a importância e não se fica ruminando". Enquanto isso, enxerga como pior defeito o excesso de paciência, algo que tem trabalhado em terapia. "Sempre fui tolerante demais com os outros e isso, em algumas circunstâncias, me fez muito mal, porque acabei aceitando coisas que não devia."

Aos 60 anos, e sem nenhum medo de envelhecer, Nereida Vergara se considera "uma mulher velha bem feliz". Sem dificuldades de encarar o que vem pela frente, não precisa de muito para correr atrás da juventude - muito menos de harmonização facial. Olhando para trás, analisa que, sim, sente-se realizada: a jornalista quebrou os limites que ela mesma impôs.

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