Decifra-me ou Desapareço: na era da atenção, entender o público é questão de sobrevivência
De Márcia Budke, para o Coletiva.net
A pandemia não apenas transformou rotinas e mercados - ela redefiniu o modo como sentimos, escolhemos e consumimos. Depois de um período de incertezas, o consumidor brasileiro emergiu mais emocional, seletivo, ansioso e em busca de propósito.
As novas pesquisas da WGSN revelam um cenário em que o consumo no Brasil é guiado cada vez mais pelas emoções - e não apenas por preço ou funcionalidade. O brasileiro quer se sentir bem com o que compra. Busca leveza, autenticidade e conexões reais com as marcas, que deixaram de ser simples fornecedoras de produtos e serviços para se tornarem fontes de significado.
Entre os perfis que despontam nesse novo mapa do consumo estão os imparciais, que valorizam transparência e ética; os autônomos, que desejam liberdade e personalização; os esperançosos, que colocam o bem-estar no centro; e os sinérgicos, que unem tecnologia, propósito e sustentabilidade.
Por trás desses perfis de comportamento, já se observam sinais de algumas das emoções dominantes que devem guiar o consumo até 2027, segundo a previsão da WGSN - Consumidor do Futuro 2027.
Alegria estratégica - representa o prazer com propósito. O consumidor não busca mais o excesso, mas experiências que tragam satisfação genuína e deixem uma sensação de bem-estar duradouro. A alegria deixa de ser impulsiva e passa a ser consciente - relacionada àquilo que faz sentido, que soma à vida e aos valores pessoais. Marcas que despertam essa emoção criam vínculos positivos e sustentáveis.
Desvontade - expressa o desejo coletivo de simplificar, reduzir estímulos e aliviar pressões. Depois de anos de sobrecarga emocional e informacional, o consumidor quer menos ruído, menos urgência e mais equilíbrio. Essa emoção impulsiona a busca por produtos e serviços que economizam tempo, reduzem a complexidade e facilitam o cotidiano - do design minimalista às experiências mais calmas e humanas.
Otimismo cético - traduz a nova forma de acreditar: com esperança, mas sem ingenuidade. O consumidor quer se engajar, mas exige provas concretas. Ele acredita no futuro, mas cobra transparência, coerência e resultados reais das marcas. Esse equilíbrio entre fé e lucidez é o que guia a confiança nas relações de consumo contemporâneas.
É interessante notar que essa virada emocional dialoga diretamente com as ideias do economista e Prêmio Nobel Daniel Kahneman, autor de Rápido e Devagar: Duas Formas de Pensar. Kahneman demonstrou que nossas decisões raramente são totalmente racionais - elas são profundamente influenciadas por percepções e sentimentos imediatos. Em outras palavras, a emoção precede a razão. E compreender esse fluxo emocional é, hoje, o que separa marcas relevantes de marcas esquecidas.
Mais do que conversar com o consumidor para vender, as empresas precisam decifrar o emocional coletivo. Entender o que inspira, acalma ou desperta confiança é o novo diferencial competitivo - capaz de impulsionar inovação, crescimento e engajamento com os clientes.
No Brasil, isso significa unir afeto, leveza e impacto positivo - o tripé que sustenta a economia emocional emergente.
Em tempos de excesso de informação e escassez de atenção, quem não entende as emoções do seu público corre o risco de não ser compreendido.
Como lembrou Kahneman, "as pessoas não escolhem o que é melhor - escolhem o que parece melhor". É justamente nessa fronteira entre razão e emoção, onde reagimos às experiências de marca, que se moldam as decisões de consumo.
Márcia Budke é sócia-diretora da Brazo Mídia.
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